Tomada de posição sobre o Projeto Lei n.o 809/XIV/2.a em prol do ensino  superior politécnico nacional e internacionalmente

Tomada de posição sobre o Projeto Lei n.o 809/XIV/2.a em prol do ensino superior politécnico nacional e internacionalmente

A organização binária do sistema de ensino superior português, conforme a conhecemos, decorreu das políticas estruturais, adotadas pelos primeiros Governos Constitucionais, a seguir ao 25 de Abril de 1974. Ao longo de vários anos, com o propósito de organizar a rede e otimizar o funcionamento das instituições, foram sendo agregadas diversas escolas e institutos, que com vasta e longa experiência na formação especializada para o exercício de funções na administração pública ou no setor privado, deram origem a uma parte significativa dos Institutos Superiores Politécnicos.

As Instituições de Ensino Superior (IES), independentemente da sua tipologia, têm acompanhado desde sempre as transformações sociais, económicas e políticas. Inicialmente eram vocacionadas principalmente para o Ensino, mas ao longo do tempo foram ganhando novas missões e, também, novos papéis. A revolução industrial veio adicionar a investigação às suas missões institucionais e, mais recentemente, foi introduzido o conceito de “extensão”. Sob este novo contexto, as IES têm sido chamadas a contribuir ativamente e de forma cada vez mais direta para o desenvolvimento social e económico.

Deste modo, a forma como o sistema e a própria rede de ensino superior se foram desenvolvendo em Portugal, replicando organizações semelhantes implementadas em outros Estados europeus, encontra-se relacionada com as necessidades crescentes de formação e qualificações, bem como, com a crescente perceção da produção de conhecimento, intrinsecamente ligada ao seu valor económico, a absorver pelos setores social, empresarial e industrial.

Por conseguinte, a rede pública de Ensino Superior Politécnico é hoje composta por 15 Institutos Superiores Politécnicos, 5 Escolas Superiores Não Integradas e 7 Universidades que agregam institutos ou conjuntos de formações superiores de caráter politécnico, naturalmente orientados para a criação, transmissão e difusão de conhecimento de natureza profissional. Todavia, nos termos da lei e das missões persecutadas pelas instituições politécnicas, a transmissão e difusão de conhecimento, para além da articulação do ensino teórico com a prática profissional, tem intensificado cada vez mais a investigação orientada com o desenvolvimento experimental.

O prestígio reconhecido às Universidades, sobretudo às mais antigas em funcionamento, aliado a uma expansão rápida e massiva da rede e do número de estudantes a frequentarem o sistema, terá fomentado um estigma cultural que penalizou o reconhecimento social dos institutos politécnicos. A notoriedade que foi sendo conquistada pelo conjunto das designadas “universidades novas”, fundadas após a Revolução de Abril, também terá contribuído para essa circunstância, motivando mesmo que institutos politécnicos como os de Vila Real ou da Covilhã viessem a adquirir o estatuto de universidades.

Em 2013, o Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP) encomendou um estudo independente ao Center for Higher Education Policy Studies, da Universidade de Twente, que é um dos principais centros de investigação em políticas de ensino superior a nível europeu. Na sequência deste estudo, foram fundamentadas várias propostas de reconfiguração do ensino superior politécnico, destacando-se a possibilidade de lecionarem programas de doutoramento e, também, a alteração da denominação para universidades politécnicas ou universidades de ciências aplicadas.

Estas reivindicações têm-se mantido presentes na agenda reivindicativa dos Institutos Politécnicos e do CCISP, mas também de várias Associações e Federações Académicas e de Estudantes, entre as quais a Federação Académica do Porto.

Conforme é do conhecimento público, em 2018, o Conselho de Ministros elaborou uma alteração legislativa, através do Decreto-Lei n.º 65/2018, de 16 de agosto, que veio alterar o regime jurídico dos graus e diplomas do ensino superior, determinando que qualquer instituição de ensino superior possa lecionar programas de doutoramento, desde que observados os critérios de exigência e de qualidade definidos na lei.

Porém, até ao momento, todos os programas de doutoramento em funcionamento em institutos superiores politécnicos são ministrados em conjunto com instituições universitárias, não tendo sido acreditado qualquer programa ministrado autonomamente. E, no que respeita à denominação destes institutos, não foram produzidas alterações legislativas que permitam a adoção de “universidade” no nome, seguido da terminologia que se vier a considerar a mais adequada.

Nos termos da lei, um conjunto de cidadãos, cuja comissão representativa reúne personalidades de renome no universo do ensino superior politécnico, instruíram uma iniciativa de projeto lei, apresentada à Assembleia da República, com o intuito de “valorização do ensino politécnico nacional e internacionalmente”.

De acordo com a exposição de motivos apresenta nesta iniciativa, deverá ser consentida a adoção de denominações que mais facilmente permitam a comparabilidade internacional, sendo invocada a terminologia “University of Applied Sciences”, que é utilizada pela Associação Europeia de Instituições de Ensino Superior.

Neste âmbito, é também explicada a perceção social e evolução do grau de doutor, que segundo os peticionários apresenta hoje formas bastante diversificadas, desde a consolidação de conhecimento teórico, ao desenvolvimento experimental em contexto de aplicação, às artes performativas e, em muitos casos, a trabalhos desenvolvidos em contexto empresarial. Aliás, a última avaliação externa realizada ao sistema de ensino superior português, pela OCDE, alertava para a importância de se alargarem o número de programas de doutoramento desenvolvidos em contexto empresarial, de forma a reforçar a ligação entre as IES e as empresas, algo que se enquadra no papel que é predominantemente atribuído às instituições do subsistema politécnico.

A FAP já defendia o aumento do número de programas de doutoramento nesse contexto, bem como, das bolsas de doutoramento em empresas, antes de apresentadas as conclusões deste relatório de avaliação. De igual modo, nos anos que antecederam a alteração introduzida à lei em 2018, a FAP alterou a sua própria Moção de Estratégia Global no sentido de defender a possibilidade legal de serem ministrados programas de doutoramento em instituições de ensino superior politécnico.

Conforme é referido na iniciativa cidadã que será debatida na Assembleia da República, essa possibilidade já é uma realidade em grande parte dos países europeus onde existem sistemas de ensino superior binários. Ademais, é do conhecimento público que muitos dos institutos politécnicos e/ou escolas superiores não integradas, detém dezenas de unidades de investigação positivamente avaliadas pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) e, em alguns casos, estão até inseridos em redes e consórcios transnacionais de investigação & inovação.

Assim, aos 22 dias do mês de junho de 2022, as Associações de Estudantes federadas na Federação Académica do Porto, deliberam:

  • Assumir publicamente uma posição de apoio e solidariedade com a proposta de Projeto Lei n.º 809/XIV/2.ª, apresentado à Assembleia da República em prol da valorização do ensino politécnico nacional e internacionalmente.

 

  • Promover a alteração da denominação legal de instituto politécnico, para universidade politécnica, através da revisão da Lei n.º 46/86, de 14 de outubro, que estabelece a Lei de Bases do Sistema Educativo e da Lei n.º 62/2007, de 10 de setembro, que consagra o Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES).

 

  • Defender a aplicação do Decreto-Lei n.º 65/2018, de 19 de agosto, que veio alterar o regime jurídico dos graus e diplomas do ensino superior, determinando que qualquer instituição de ensino superior possa lecionar programas de doutoramento, desde que demonstrada a capacidade de desenvolver atividades de Investigação e Desenvolvimento (I&D), ter pelo menos 75% dos recursos humanos integrados em unidades de investigação e conseguir obter uma avaliação mínima de "Muito Bom", atribuída pela FCT.

 

  • A aplicação do “regime de instalação” previsto nos Artigos 38.º e 46.º do RJIES, enquanto período transitório para a verificação dos requisitos de exigência e qualidade determinados no Decreto-Lei n.º 65/2018 e no RJIES, no que respeita à composição de um corpo docente que satisfaça os requisitos legais, ao número de ciclos de estudos em funcionamento e a centros de investigação e desenvolvimento devidamente avaliados.

 

  • O estudo da integração das Escolas não Integradas na Instituição de Ensino Superior que se revele mais adequada, em função do meio geográfico onde esta escola se encontre inserida.